sexta-feira, 10 de agosto de 2012

O dia em que choveu fogo - parte 3/5


O início está disponível em: http://pedro-cipriano.blogspot.de/2012/08/o-dia-em-que-choveu-fogo-primeira-parte.html
A segunda parte pode ser encontrada aqui: http://pedro-cipriano.blogspot.de/2012/08/o-dia-em-que-choveu-fogo-segunda-parte.html

A maioria dos soldados mostrou-se um pouco mais confiante ao ouvir aquelas palavras desajeitadas, pois apelava ao seu ódio pelo inimigo. A moral não se manteve por muito tempo, sendo totalmente arrasada com o chegar dos abastecimentos. Em termos de comida, eram muito reduzidos, dando apenas um bocado de pão a cada um. Se haviam ficado desapontados com a alimentação, as armas deixaram-nos completamente desesperados. Havia apenas uma dúzia de pistolas e outra de espingardas. Munições vinham em duas caixas minúsculas. Para além disso, havia somente duas caixas de granadas. Nem o tenente conseguiu disfarçar a irritação que sentia.
- Não se preocupem, soldados. Deve ter havido algum engano. Eu irei pedir mais armas, munições e comida. Vamos ver se consigo arranjar uma ou duas peças de artilharia - prometeu apressadamente o jovem.
Quando o comandante foi à procura do comissário, as conversas que se seguiram provaram que ninguém havia acreditado na desculpa do engano. Alexey ouviu de tudo um pouco, desde insultos a propostas de fuga. Evitou participar, já que não queria arranjar mais sarilhos do que aqueles em que estava metido.
O pôr-do-sol revelou uma cidade em chamas. Os disparos de artilharia nunca cessaram por completo. Corriam rumores de que os alemães teriam já chegado ao rio, cercando a cidade e os seus defensores. Não chegaram mais abastecimentos e muito poucos dos soldados que tinham fugido durante o bombardeamento haviam regressado.
Parte das trincheiras foi reaberta e preparada para a noite. Enterraram os mortos num terreno adjacente e os feridos foram evacuados para a cidade. Finalmente, recolheram aos seus buracos no lusco-fusco.
Cansado e desmoralizado, escolheu um local para se deitar. Com um bocejo, pousou a seu lado a granada que lhe tinham dado e enrolou-se no seu cobertor, preparando-se para passar a noite. Ficara na extremidade da vala partilhada pelo resto do seu grupo de combate. No centro do buraco ardia uma fogueira que providenciava uma parca iluminação. Não havia comido o pedaço de pão que lhe calhara durante a tarde, pois receava não receber outro no dia seguinte.
Depois de cair a escuridão, tentou dormir, mas não conseguiu. As imagens dos aviões semeando a morte perturbavam-no fortemente. Não conhecia nenhum dos que havia falecido, aliás, procurara em vão pelos corpos dos três rufias. Não voltara a vê-los, por isso deduzira que haviam fugido.
Ouviu algo a seu lado. Um vulto acabara de entrar na trincheira. Quis dar o alarme, todavia o grito ficou-lhe preso na garganta. Era o líder dos rufias.
- Não precisas de ter medo, eu não vim para te fazer mal – prometeu com um tom e um sorriso que não inspiravam qualquer confiança.
Alexey não lhe respondeu, já que os seus piores receios se haviam tornado realidade.
- Estou a ver que ficaste mais esperto. Agora vais partilhar o teu pão comigo e ficamos todos amigos. Pode ser?
O tom de ameaça não lhe escapou. Sentiu a fúria a crescer dentro de si, estava farto de ser maltratado pelos brigões. Queria encontrar uma solução definitiva para aquele problema, mas não lhe ocorreu nada durante aquele momento que lhe foi dado para pensar. Queria lutar, mas sabia não estar à altura de o enfrentar.
- Então, miúdo? Ou me dás o teu pão ou vou ter que te partir os dentes.
- Já o comi... - mentiu Alexey, a tremer.
- Tu a mim não me enganas! Dá-me o pão, já! - exigiu, agarrando-o pelo colarinho.
- 'Tá bem! Eu já te dou.
Entre o humilhado e o agitado, retirou o pão do bolso e estendeu-lho. Como provocação, o outro rapaz decidiu comê-lo à sua frente. Alexey usou todo o seu auto-controlo para não o atacar. O rufia extorquiu-lhe também o cobertor e quis dormir ao seu lado, mesmo junto à extremidade da vala.

A continuação está aqui: http://pedro-cipriano.blogspot.de/2012/08/o-dia-em-que-choveu-fogo-quarta-parte.html

Nenhum comentário:

Postar um comentário